A
literatura da Cultura Hip Hop
(por Negro Dhy - negro-dhy@hotmail.com)
Rap – A arte de rimar. A literatura
da Cultura Hip Hop. O canto falado, o elemento oral milenar que
nos leva aos cantos tribais, ou ainda aos escravos cantando em
plantações. Acreditar que o Rap é homogêneo é tolice. Já se falou
de tudo no Rap, contudo, as fases mais marcantes são três:1. o
Rap ingênuo, positivo e alegre; 2. O Rap político, contestador,
combativo; 3. O Rap Gangsta que reflete o dia-dia da periferia,
um mundo repleto de drogas, violência, ostentação e mulheres.
MC - O “rimador”. O MC tem a preocupação de sempre representar
a Cultura Hip Hop. Com o crescimento do RAP e o distanciamento
da Cultura Hip Hop, o MC passou a se chamar Rapper
Rapper - Pessoa que canta/faz Rap. Hoje o rapper está bastante
distante da figura do MC que buscava o entretenimento, a diversão
e a energia positiva. Hoje o Rapper está vinculado a luxúria,
ostentação de propriedade, violência e drogas, principalmente
nos EUA. No Brasil, os envolvidos no Rap ainda “representam” nas
suas comunidades de origem.
No Hip Hop foi, de novo, Kool Herc um dos principais “culpados”.
Ele convidou um camarada seu para apresentar e comentar as seleções
que ele tocava nos bailes. Coke La Rock era o Mestre de Cerimônia
(MC) de Kool Herc sempre agitando com frases que se tornaram clássicas
como Ya rock and ya don’t stop!, Rock on my mellow! e To the beat
y’all!. Alguns afirmam Coke La Rock como o primeiro rapper dentro
do Hip Hop.
Outro pioneiro também tinha a sua banca. Grandmaster Flash tinha
uma relação inconstante com um grupo de MCs chamado Furious Five
(Melle Mel, Kidd Creole, Rahiem, Scorpio e Cowboy). Inconstante
porque havia apresentações em que todos os cinco apareciam, em
outras, nenhum dava as caras.
Esta era uma época de inocência. A criação do Hip Hop foi envolvida
por uma grande carga de positividade. Não havia a consciência
das classes econômicas explícitas nas letras, não havia a indústria,
o dinheiro e a mídia. Mas havia Sylvia. Bem ou mal, o selo Sugar
Hill abriu o tão bem/mal falado mercado para o Hip Hop.
Hip Hop fala contra o racismo e a desigualdade social
Muitas das manifestações culturais brasileiras estão identificadas
com a população negra. O samba, caboclinho, maracatu, movimento
Mangue Beat, capoeira e muitas outras são lembradas como parte
da grande contribuição dos negros para a cultura nacional. Dentro
dessa diversidade, o movimento Hip Hop tem ganhado cada vez mais
destaque no Brasil e atraído muitos jovens, especialmente aqueles
que moram nas periferias.
Não é nada fácil entender o Hip Hop, que veio da periferia nova
iorquina para o Brasil no final da década de 1980, via indústria
fonográfica. É um movimento com várias tendências internas, mas
que pauta-se pela denúncia da exclusão social e pela discussão
de questões relativas à história e à identidade dos negros.
Formado por três elementos - o rap (música), o break (dança) e
o grafite (desenho) - ao chegar no Brasil ele foi influenciado
pela cultura local e adquiriu novos traços e novas formas de manifestação.
Em parte, por causa da influência cultural local, o Hip Hop brasileiro
diferencia-se do norte-americano. "O brasileiro é muito melhor
do que o americano, que foi banalizado. Muitos representantes
do Hip Hop lá fora se venderam para o sistema. Eles não querem
ver o bem do povo deles, eles querem que o seu povo se mate para
conseguir um Nike, um carro... No Brasil, o Hip Hop é mais consciente,
quer ver o povo melhorar, prega a informação", afirma Cibele Cristiane
Rodrigues, militante do movimento.
Esse papo é da Cibele e Verônica, militantes do Hip Hop
Não é à toa que o Hip Hop tem ganhado cada vez mais militantes
e mais espaço no Brasil. Segundo Viviane Melo de Mendonça Magro,
psicóloga que estuda o movimento no Brasil, com ênfase na questão
de gênero, sua popularidade se deve ao fato de ser um movimento
enraizado nas experiências de jovens e pessoas que vivem na periferia,
além de ser muito organizado. "As histórias do rap são histórias
fictícias ou reais de pessoas que vivem na periferia, baseadas
na vivência na periferia. Para elas, o Hip Hop é uma forma de
resistência e mudança da realidade", conta Viviane Magro.
No Hip Hop brasileiro, exclusão social e preconceito racial são
evidenciados Nos presídios, os rappers são muito populares. Por
causa das letras politizadas, que falam da realidade exclusão
social e do preconceito de cor, um show de rap dentro de um presídio
não é um show qualquer, mas uma manifestação político-social.
Foi isso o que aconteceu em uma visita do famoso rapper Mano Brown,
do Racionais MC, em junho de 2003, na Febem do Brás, em São Paulo,
mostrando a força do Hip Hop como movimento de emancipação social.
Os detentos sabiam todas as letras e se identificaram com as músicas
do rapper.
Além de buscar a construção de uma identidade negra, que se posiciona
fortemente contra o preconceito de cor, é dada também ênfase ao
marginalizado que vive na periferia. "Para o Hip Hop, marginalizado
é quem vive na periferia. O que une é a desigualdade social, e
a maioria é negra" explica Magro. "Tanto os brancos quanto os
negros tem sua auto estima melhorada dentro do movimento e se
identificam através da exclusão social. ", complementa.
A militante Rodriguez reforça a idéia de busca por igualdade.
"Tentamos nem tocar nesse negócio de negritude, branquitude, essa
fita toda, porque o Hip Hop quer atingir uma classe social, é
para os desfavorecidos". Entretanto, Cibele salienta que o movimento
busca através das várias formas de expressão evidenciar o histórico
dos negros no Brasil. "É importante que todos entendam que os
negros são excluídos porque foram escravizados".
Hip Hop brasileiro é diferente do norte americano
Apesar de existir uma tendência de apropriação de alguns símbolos
de uma cultura negra internacionalizada - como as roupas - dando
a impressão de um movimento globalmente mais uniforme, as muitas
diferenças que separam brasileiros e norte-americanos ajudam a
determinar, no Brasil, um Hip Hop diferenciado. Os próprios militantes
brasileiros consideram o Hip Hop nacional como um movimento muito
mais crítico e politizado que o norte-americano.
"O break, por exemplo, tem muita semelhança com a capoeira, como
já observaram os militantes do Hip Hop norte americano", afirma
Magro.
Devido à influência cultural brasileira no movimento, só o Hip
Hop brasileiro tem rap com um pouco de samba, break parecido com
capoeira e grafites de cores nitidamente mais vivas. Segundo a
pesquisadora, essa mistura com elementos brasileiros é motivo
de orgulho para o Hip Hop brasileiro, que tende a uma valorização
crescente dos elementos nacionais em um movimento importado dos
EUA.
Por razões históricas, e da mesma forma que o Hip Hop, o samba
ainda é uma manifestação cultural vista com preconceito "Os brancos,
a princípio, tratavam o samba como caso de polícia. No começo
do século passado, os negros não podiam cantar e dançar dentro
de suas casas. Muito negro apanhou de polícia porque o samba era
proibido ou severamente reprimido. Era associado à feitiçaria
ou à perturbação da ordem pública. Até hoje esse preconceito sobrevive
na cabeça da elite brasileira", diz Ribeiro. Como no Hip Hop e
em outras manifestações culturais brasileiras, o samba além de
negros, tem também muitos brancos, como o genial Noel Rosa "Mas
a base de suas referências culturais, contudo, é negra", lembra
Bruno.
Segundo o sambista, o papel dos negros no samba, atualmente, é
muito importante. "É preciso recuperar e preservar sua história
dentro do samba, pois a indústria cultural, a partir do momento
em que investe na criação de um gênero pop, batizado de "pagode",
tira toda a essência que havia no samba para torná-lo palatável
a uma classe média consumidora e transformá-lo em mercadoria",
adverte. "Creio que o papel do negro, hoje, é estudar o seu passado
e defender as suas tradições, negando-se a vender a história de
seu povo por promessas de dinheiro e de fama. O papel dos brancos
que fazem samba é também lutar em defesa dessa cultura, afinal,
somos todos brasileiros e o samba pode ser um grande unificador
nacional".
Na opinião de Ribeiro, gêneros musicais como o rap e o samba não
são incompatíveis "Se você for em qualquer periferia do Brasil
vai ver que os caras que gostam de rap costumam fazer roda de
samba no boteco da esquina, quando chega o fim de semana. Não
dá para falar em samba apenas como produto musical. O samba é,
antes de mais nada, o encontro da comunidade, nasce quando um
grupo de pessoas se reúne em torno de uma mesa para cantar e tocar,
enfim, para partilhar alegria".
"Eu me organizando posso desorganizar"
Movimentos como o Hip Hop mostram que as formas de expressão cultural
no Brasil podem ser usadas na luta contra a discriminação racial
e desigualdade social. Por isso, o Hip Hop tem dado muita ênfase
para as ações práticas e os militantes têm se organizado nas periferias
promovendo oficinas, informando as pessoas e incentivando a luta.
Na opinião da rapper Verônica, do grupo Cabelo Duro, apesar da
opinião contrária "e preconceituosa" de sua família sobre o Hip
Hop, valeu a pena se integrar ao movimento. "Depois que eu comecei
a ser militante percebi o quanto minha vida sempre foi fudida,
no sentido literal da palavra.. Mas agora, eu sei que posso lutar
para melhorar, agora eu sei que eu tenho muitos direitos e que
devo lutar por eles. Por ter entrado no movimento, eu comecei
a ter acesso a muitas informações, que pessoas que eu conheço
que não são do movimento nunca tiveram. Eu não me vejo melhor
do que minhas amigas que seguiram uma vida mais tradicional, mas
eu me vejo com mais oportunidades porque tenho mais informação"
.
Já dizia Chico Science, também influenciado pelo Hip Hop pernambucano:
"eu me organizando posso desorganizar". O Hip Hop se organiza
cada vez mais e os seus militantes têm razão quando definem o
movimento como uma arma.
Os negros e o samba no Brasil
Segundo Ribeiro, o samba é uma manifestação cultural relativamente
recente, pois tornou-se canção popular somente no princípio do
século XX. "Na Bahia, ele assumia a forma de canto religioso aliado
aos instrumentos de percussão do candomblé. Na época em que os
negros baianos desceram para o Rio de Janeiro em busca de trabalho
nos portos, foram morar, sobretudo, na região da Central do Brasil,
onde foram fundadas as casas das `tias` baianas - senhoras negras
ligadas ao candomblé que faziam encontros religiosos no quintal
de casa, e esses encontros eram verdadeiras festas, regadas a
comida, cachaça e batucada." Dentre essas "tias" baianas, destacou-se
Tia Ciata, que morava na Rua Visconde de Itaúna, 117. Essa casa
se tornou reduto de músicos cariocas como Pixinguinha, Donga e
Sinhô, entre outros. Foi, provavelmente, dessa convivência do
batuque africano com a canção popular, que o samba tal e qual
o conhecemos hoje, começou a ser desenhado. Em 1917, tem-se o
registro do primeiro samba gravado: "Pelo Telefone", de Donga,
freqüentador da Tia Ciata, e do jornalista Mauro de Almeida. "Mas
esse samba, embora trouxesse já uma base percussiva, mostrava
muita influência do maxixe. A palavra "samba" vem, possivelmente,
da palavra "semba", usada para designar a dança de umbigada, trazida
pelos escravos" explica o sambista.
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