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ENTREVISTAS



Entrevista de Gustavo Dourado a Wesley Gonçalves

01 - Por conhecer tão bem a literatura de cordel, existe alguma diferença entre o Cordel no nordeste e o daqui de Brasília?
GD - A literatura de cordel atual, nordestina ou brasiliense, tem origens eruditas, na literatura medieval dos trovadores albigens provençais, na França.
Depois ganhou o mundo, Espanha, Portugal, Brasil, via Bahia, Pernambuco, Paraíba, Ceará e em todos os estados do Nordeste. Com a construção de Brasília, o cordel criou raízes no Planalto Central, por meio dos candangos pioneiros e operários da construção civil. O cordel marcou presença no início da construção com os poetas e cordelistas anônimos. Cheguei a conhecer alguns desses candangos como o Tião Varela , Ligeirinho da Candangolândia. Vi outros em Ceilândia, Gama e Taguatinga e nas feiras. Mas a maioria dos poetas ficaram anônimos e suas obras sumiram nas argamassas do concreto. É preciso uma pesquisa séria para se resgatar os primeiros poetas populares de Brasília.
Quase não se tem diferença entre a literatura de cordel praticada em Brasília, com a praticada no Nordeste, a não ser algumas influências de informção, gramatical, lingüística e de cultura regional.
02 - Como entrou em Brasília a literatura de cordel?
GD - O cordel veio para Brasília no início da construção com os primeiros operários e pioneiros. Surgiu nos acampamentos da Vila Operária, atual Candangolândia, Núcleo Bandeirante, Vila Metropolitana, Vila Planalto, Taguatinga, Granja do Torto e nos diversos acampamentos das construtoras.
A presença do cordel é mais destacada nas cidades peirféricas e no Entorno. Ceilândia, pela grande presença de nordestinos, é um centro de poesia popular, com destaque para a Casa do Cantador. O cordel está presente no Plano Piloto, na UnB, no Congresso Nacional e em vários órgaos públicos.
Tem muita gente que faz experiência com o cordel: professores, escritores, jornalistas, compositores. O cordel tem uma forte presença na Internet e Brasília tem os seus representantes..
03 - Em que contexto se encontrava a capital quando essa literatura de traços tão nordestinos se implantou aqui?
GD - Brasília estava no início da construção e era forte a presença dos nordestinos, principalmente na Cidade Livre(Núcleo Bandeirante/Candangolândia) e nos diversos acampamentos. Muitos eram retirantes e já eram poetas em suas cidades de origem, nos vários estados do Nordeste. Aqui , continuaram a fazer os seus versos e a relatar a epopéia da construção e os feitos dos pioneiros e do presidente JK.
04 - Há quanto tempo existe esse movimento cultural em Brasília?
GD - Desde 1956, com o início da construção. Hoje, o cordel tem a vertente tradicional dos folhetos e a vertente moderna, via Internet.
05 - Quais são as características da literatura de cordel brasiliense?
GD - São as mesmas do cordel nordestino. Narra as epopéia do povo, feitos, milagres, notícias, crimes, biografias. Geralmente são narradas em sextilhas e mantém a mesma estrutura do cordel tradicional.
06 - Existem cordelistas nascidos aqui em Brasília?
GD – Creio que já deva existir. Lá pelo Núcleo Bandeirante, CandangoLãndia, Gama, Taguatinga, Paranoá . Ceilândia já deve ter a sua primeira safra de poetas. É preciso pesquisar. O espaço para a poesia é ínfimo. Há muito preconceito contra a literatura de cordel. A nossa elite é muito americanizada e quase não valoriza a cultura popular, com exceção do samba e do carnaval. A imprensa de Brasília é muito elitista e pouca divulga a literatura de cordel. O negócio deles é rock e indústria cultural.
07 - Qual é a origem da literatura de cordel em Brasília e de onde vem essas influencias?
GD – A origem é o Nordeste, de todos os estados. A influência vem dos candangos pioneiros e dos migrantes, principalmente via êxodo rural.
08 - Por essa literatura ser oriunda de estados que viveram e vivem constantes problemas, como a seca, fome e a mal distribuição de renda, como pode essa literatura ser incrementada em uma outra região, no caso Brasília, que tem um contexto em modos gerais completamente diferente?
GD – O homem é sentimental onde quer que esteja. Brasília têm várias facetas e ângulos. A Brasília dos Palácios e Mansões, não é mesma da Vila Estrutural, de Itapoã, Arapoanga, Recantos das Emas e do Entorno. Tem uma Brasília que vive problemas sérios de desemprego e subemprego e essa Brasília é muito parecida com o Nordeste...Daí é um passo para que os poetas retratem as suas mazelas e problemas.

Como complemento indico alguns textos de minha autoria que podem ser lidos em:
http://www.gustavodourado.com.br/cordel.htm
http://www.saladepoetas.eti.br/dourado/fome/fome.htm
http://www.prefacio.net/index.php?view=detalhesartigo&codigo=13881
Tese sobre o cordel. Importante entrevista a Patrícia Araújo.

 

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