O
homem do toque de ouro
(por José Aloise
Bahia)
E lá estava ele dançando pelo gramado. Na falta, no lançamento,
a bola faz um arco do triunfo. Dribla o vento, como uma suave
música passa pela zaga, e cai lentamente nos pés do colega que
arremata para a rede.
O balet francês girou, girou, bailou. Deitou e rolou. Estampado
pelo azul, branco e vermelho, cores que acalentam um ensaio de
orquestra com seus músicos criativos, soberbos, impolutos. Incríveis.
Afinados. Plurais. O maestro da sinfonia tem um nome: Zinedine
Zidane.
Ele não se preocupou em bater forte na bola. Somente colocou.
Antes disso, estava em todo o campo. Cobrindo, marcando, criando
e abrindo espaços. Ele não deu mole pra ninguém. Eis o homem do
toque de ouro. Quando esperavam que terminasse a Copa do Mundo
de uma maneira patética, ensinou a todos o valor da idade. Da
experiência. Demonstrou que iniciativa e garras afiadas habitam
as pernas do le coq sportif.
O resultado impediu o avanço do Brasil, uma seleção covarde e
sem raça, mas o destino do homem do toque de ouro já estava traçado.
A sua determinação é tanta, que faz dele um jogador fora de série.
Deixou para trás um bando de "galáticos" atordoados e caminha
rumo aquilo que merece, a consagração nos gramados germânicos.
Enquanto determinado técnico insistia num esquema tático que não
levaria a lugar nenhum, os jogadores adversários eram notáveis.
Muito mais, com liberdade, igualdade e fraternidade pareciam deuses
conduzidos por uma flauta mágica que encheu os meus olhos de graça.
Tive a sensação de um espetáculo natural de grande beleza estética.
Na realidade, eu vi também um grande jogador fazer aquilo que
os "outros" queriam e não conseguiram. Pois lhes faltaram a convicção,
o carisma, a dignidade e o respeito às suas histórias e a do seu
país. Reenfatizando, o homem do toque de ouro fez uma nação de
mais de 180 milhões de habitantes calar o bico.
O que pode ser dito aos outros times finalistas, para Portugal
em especial, é que a agremiação francesa merece respeito. Deve
correr muito, se é que queiram parar os destemidos bleus. Pode
ser que consiga, mas quem tem um maestro chamado Zinedine Zidane,
por mais velho que seja, está muito bem acompanhado.
A Copa do Mundo ficou mais madura e menos volúvel diante dos sonhos
inocentes de mentes (a)traídas pelos desejos bestas. Se eu fosse
o Parreira ajoelharia aos pés do jogador, abriria o bico e faria
um pedido: - Zidane não encerre a carreira, ensine pra nós como
é dar um verdadeiro toque de ouro e graça à nossa seleção. O futebol
merece.
José Aloise Bahia (Belo Horizonte/MG). Jornalista, escritor
e ensaísta. Articulista da revista PQN Notícias, BH, MG. Torcedor
do Cruzeiro. Um cara chateado com os mandos e desmandos da CBF.
Atleta de joguinho de botão em Brasília, DF. Autor de Pavios Curtos
(poesia, anomelivros, 2004) e Em Linha Direta (dissertação, ainda
no prelo). josealoise@terra.com.br
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