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19 DE JUNHO DE CHICO BUARQUE
(por Luiz Alberto Machado)

Era eu ainda menino quando cantarolava Carolina, A Banda, Januária, Bom Tempo, canções essas que embalavam a minha já múltipla percepção, tagarela que era de cantar Luiz Gonzaga, Noel Rosa, Cartola, Lupicínio, Roberto Carlos e de arremedar Beatles e outros sucessos do momento. Mas foi A Banda que, enxerido maluvido que sempre fui desde peraltinha da beira do rio, repetia para as frochosas do lugar: "...a namorada que contava as estrelas parou para ver, ouvir e dar passagem... a moça feia debruçou na janela pensando que a banda tocava pra ela...". Ôxe, era o que eu mais solfejava.
Quando ganhei o vinil de Construção, eu ainda nem tinha tirado a catinga do mijo. Era ainda um precoce tagarela que nem tinha alcançado direito à adolescência. Verdade, Nem direito adolescente era.
E foi com Construção que aprendi a ouvir Chico Buarque. Ouvir, cantarolar e ficar arranhando no violão Sabiá, Apesar de Você, Angélica.
Os que me rodeavam, tiveram que ter paciência para me ouvir enrolar: "Roda mundo, roda gigante, roda moínho, roda..." ou mesmo "Não chore ainda não que eu tenho um violão e nós vamos cantar um samba tão imenso que eu às vezes penso que o próprio tempo vai parar pra ouvir.... olê, olé, olê, olá...". ou, ainda "Deixe em paz meu coração que ele é um pote até aqui de mágoa e qualquer desatenção, faça não, pode ser a gota d´água". E não fiquei só nisso, li Fazenda Modelo. Depois Calabar, o elogio da traição e curti todas as músicas da parceria Chico & Ruy Guerra. Desde Vence na vida quem diz sim até a Ana de Amsterdã, Bárbara, Cala boca, Bárbara e, claro, como não poderia deixar de ser, Fado Tropical: "Ó musa do meu fado, ó minha mãe gentil, te deixo consternado no primeiro abril, mas não sê tão ingrata, não esquece quem te amou, de quem numa bravata se perdeu e se encontrou, ai, essa terra ainda vai cumprir seu ideal, ainda vai tornar-se..."
Em seguida, Gota D´Água, com Paulo Pontes na releitura de Eurípedes na tragédia de amor de Jasão e Joana.
A Ópera do Malandro, relendo Brecht com notáveis canções como o Hino de Duran e a Geni e o Zeppelin.
Enfim, de Estorvo até Budapest.
E não adianta falar muito da obra de Chico Buarque porque ela fala por si mesma. Além do mais, tem livro a fole por ai que esmiúça a obra dele.
Bem, o que quero dizer é que conheci o Chico que falava do Rio, do Redentor, de Ipanema, Copacabana, falando num Partido Alto toda índole do Malandro e da Derradeira Estação: o Chico Buarque do Rio de Janeiro.
Com ele vi o cronista participante que gingava no futebol esperando o carnaval chegar, sambando dia e noite no meio dos sonhos de um cordão imenso e libertário para construir uma idéia que se fizesse justiça e liberdade em todo território nacional: o Chico Buarque do Brasil.
E vi a lírica de embalar a alma feminina, como também de acalentar o filho deserdado da vida, do desterrado sem terra para morrer, de cantares de esperança inatingível: o Chico Buarque da Poesia da Vida de todos os seres. Outros personagens se incorporaram nele, todos no tom do brasileiro, do poeta, do cantor libertário que continua sendo a voz autêntica da resistência e da luta para um mundo melhor para todos: esse, simplesmente, Chico Buarque de Holanda. Parabéns, mestre Francisco.

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